terça-feira, setembro 30, 2008
no dia de São Nunca, à tarde
a expressão "no dia de S. Nunca, à tarde" indica que um determinado acontecimento ou desejo é previsivelmente impossível de realizar, ou não temos vontade que se realize.
exº: "casarei contigo no dia de São Nunca, à tarde"; "vamos agendar isso para o dia de São Nunca, à tarde".
expressão equivalente: "quando as galinhas tiverem dentes".
segunda-feira, setembro 29, 2008
ribanceira (Pt., Gz. e Br.)
ribanceira é uma coisa de onde muita cousa cai: ou caiam cousas de cima ou caiam coisas lá abaixo.
muita gente sonha com precipícios e ribanceiras. o que esses sonhos tenhem de bom é que a gente acorda meio metro antes de chegar ao fundo.
de primeira apanha
domingo, setembro 28, 2008
puxar a brasa à sua sardinha
além de dar informações óbvias sobre a dieta popular, a expressão "puxar a brasa à sua sardinha" ou "chegar a brasa à sua sardinha" significa "tratar dos seus interesses", "aproveitar toda a ocasião ou ensejo para realizar os seus intentos", "ser egoísta".
e vejam aí esses versos:
"cada um tenta puxar a brasa à sua sardinha"
é antigo esse ditado,
que tem certo fundamento,
pra se fazer julgamento
do seu significado,
o qual tem sido aplicado
da forma que se alinha,
pois o homem se encaminha
para se locupletar.
cada um tenta puxar
a brasa à sua sardinha.
cada um por si e Deus
por todos, outro ditado,
para ser analisado
por ilustres e plebeus,
evangélicos e ateus,
qualquer um que se sublinha,
essa citação eu tinha,
para um dia revelar.
cada um tenta puxar
a brasa à sua sardinha.
é um gesto corriqueiro,
praticado em todo canto,
não é de causar espanto,
muitas vezes verdadeiro
em certos casos, primeiro,
quem se previne, adivinha,
cuida, protege e caminha
para o que lhe interessar.
cada um tenta puxar
a brasa à sua sardinha.
tem aquele que apela
para Deus, o que deseja,
comparece a uma igreja,
a um santuário ou capela,
reza uma salve-rainha,
no altar, banco ou lapinha,
pra seu desejo alcançar.
cada um tenta puxar
a brasa à sua sardinha.
para suas conveniências
às vezes uma criatura,
com arte e desenvoltura,
age para diligências
das diversas incumbências,
com as quais se apadrinha,
se afirma e se aninha,
sem aos outros se importar.
cada um tenta puxar
a brasa à sua sardinha.
tem gente que negocia,
procurando convencer,
diz que vai desenvolver
um plano de primazia,
chama toda freguesia,
faz aquela ladainha,
mas nem bate a passarinha,
se o cliente se enrolar.
cada um tenta puxar
a brasa à sua sardinha.
é normal num desafio
entre vates cantadores,
parecendo dois tenores,
cada um mostrando brio,
se declara ser bravio,
e aí efervesce a rinha,
no toque da violinha,
passa a se vangloriar.
cada um tenta puxar
a brasa à sua sardinha.
Quem quer a sardinha assada,
procura puxar a brasa,
com jeito e não se atrasa,
para ter assegurada
sua parte desejada,
sem perder essa boquinha,
quem sabe, busca, caminha
para se realizar.
cada um tenta puxar
a brasa à sua sardinha.
assa carne de pavão,
de porco, peba, tatu,
de bode, gado, peru,
codorniz, arribação,
milho, bolo, queijo, pão,
preá, batata, galinha,
peixe, filhós, batatinha,
tudo o que se pode assar.
cada um tenta puxar
a brasa à sua sardinha.
tem muita gente egoísta,
só pensa em tirar proveito
para si de todo jeito,
não muda o ponto de vista,
achando ser uma conquista,
não passa de picuinha
essa atitude mesquinha,
que não é nada exemplar.
cada um tenta puxar
a brasa à sua sardinha.
vê-se gente dar atenção
pra si mesmo e mais ninguém,
trata os outros com desdém,
passa a ser obsessão,
não ajuda a seu irmão,
nem até sua mãezinha,
achando bom a vidinha,
a ninguém quer ajudar.
cada um tenta puxar
a brasa à sua sardinha.
tem pessoa impertinente,
intragável, presunçosa,
imbecil, reles, teimosa,
antipática, renitente,
tacanha, inconveniente,
só anda fora da linha,
com sua cara lisinha,
sem nada para agradar.
cada um tenta puxar
a brasa à sua sardinha.
vê-se pessoa que quer
conseguir algo na marra,
insiste e não se desgarra
do seu ávido mister,
não mede e dê o que der,
sua conduta daninha
irrita, incomoda, espinha,
e só faz contrariar.
cada um tenta puxar
a brasa à sua sardinha.
(José de Sousa Dantas, in Usina de Letras, Secção Literatura de Cordel)
ir abaixo de braga
talvez por isso se diz mais depressa "mandei-o abaixo de Braga" do que o imperativo "vai abaixo de Braga!"
ouço a expressão desde pequeno, sobretudo na própria cidade de Braga e seus arredores. o certo é que nunca ninguém me soube explicar a origem da expressão. mas tendo em conta o seu significado picaresco, é possível que tenha tido origem num trocadilho entre Braga e bragas, sendo que a palavra "bragas", que se mantém viva em Espanha, caíu em desuso por aqui. diga-se de passagem que o mais certo é que Braga e bragas tenham origem comum na tribo brácara, que, ao que consta, terá sido a fashion designer dessa peça de roupa. em versão já um poucochinho démodée, obviamente.
seja como for, a expressão é muito mais compreensível se na origem tiver sido "ir abaixo de bragas". que é como quem diz "ir à merda". com vossa licença, claro.
paspalho
imagem: aqui
sábado, setembro 27, 2008
mal-entendido
os mal-entendidos são particularmente sérios na comunicação amorosa e no discurso diplomático: um ligeiro desvio de código, uma interferência maldosa, uma desconfiança infundada, uma coincidência inoportuna, e zás! estala a confusom.
mas só pode haver mal-entendidos onde houver comunicação. e é isso que salva a maior parte dos mal-entendidos.
ter bichos carpinteiros
equivalente: "ter o formiguilho no cu" (Gz.). contributo de LQB - ver Comentº.
levar a mal
às vezes o "levar a mal" é fruto de um mal-entendido, pois a reação nem sempre está de acordo com a intenção do dito ou feito que a provocou. e como somos todos uns vidrinhos de cheiro, mais suscetíveis do que empáticos, usamos muito mais vezes a expressão "levar a mal" do que "levar a bem".
sexta-feira, setembro 26, 2008
entender (Pt., Gz. e Br.)
"entender" (subst.) significa "parecer", "opinião".
no meu entender, entender alguém pode não ser mais que um conjunto de mal-entendidos que fazem um novo sentido em comum. o que interessa de verdade é a cumplicidade que se cria. há muitos anos alguém me disse: "pouco importa o que estás a dizer, adoro a forma como o dizes". em suma: não interessa a letra, o que mais conta é a música.
quinta-feira, setembro 25, 2008
corrupio (Pt. e Br.); corrúpio (Gz. e Br.)
"corrúpio" (Gz.): brinquedo formado por uma peça de barro com dois buracos pelos quais entram dois fios que puxados a põem em movimento (Gz.).
"corrúpio" (adj.): "cruel", "perverso"; "ferrenho", "feroz", "empedernido" (Gz. e Br.).
e aqui vai um extrato de um textinho de Rubem Alves, psicanalista-escritor, sobre corrupios:
abri o meu baú de brinquedos. piões, corrupios, bilboquês, iô-iôs e uma infinidade de outros brinquedos que não têm nome. seria indigno que eu levasse piões e não soubesse rodá-los. peguei um pião e uma fieira e fui praticar. estava rodando o pião no meu jardim quando um cliente chegou. olhou-me espantado. ele não imaginava que psicanalistas rodassem piões. psicanalista é pessoa séria, ser do dever. pião é coisa de criança, ser do prazer. acho que meus colegas psicanalistas concordariam com meu paciente. a teoria diz que um cliente nada deve saber da vida do psicanalista. o psicanalista deve ser apenas um espaço vazio, tela onde o paciente projeta suas identificações. mas a minha vocação é a heresia. ando na direção contrária. "você sabe rodar piões?", eu perguntei. ele não sabia. acho que ficou com inveja. a sessão de terapia foi sobre isso. e ele me disse que um dos seus maiores problemas era o medo do ridículo. crianças são ridículas. adultos não são ridículos. aí conversamos sobre uma coisa sobre a qual eu nunca havia pensado: que, talvez, uma das funções da terapia seja fazer com que as pessoas não tenham medo das coisas que os "outros" definem como ridículo. quem não tem medo do ridículo está livre do olhar dos outros.
(in: Correio Popular, de Campinas, SP, Br.).
terça-feira, setembro 23, 2008
columpio (Gz.)
não resisto a resumir o conto Novo de Parmuide, de Álvaro Cunqueiro, em Xente de Aquí e de Acolá.
Novo, um rapaz de Parmuide, apaixonara-se polos columpios nas festas de Mondonhedo e de Lugo. tanto, que feira ou arraial a que ele fosse tinha que lá gastar o dinheiro a columpiar-se. já home completo, Novo mandou vir um columpio individual, de cadeado, com assento forrado a pano verde, de onde caíam uns guizos. e montou-o na eira. sempre que podia, fazia a sesta no columpio e se queria provar amizade a alguém convidava-o a columpiar-se nele.
na tropa, um camarada que curava cavalos ensinara-lhe um montóm de receitas coas que apanhou o jeito e o vício de curar. e mais tarde, nom se sabe quando, Novo haveria de ajuntar o seu columpio ao já composto arsenal terapêutico. a princípio curava só catarros, com umas quantas doses de columpio, mas depois começou a aventurar-se às dores de cabeça, ao raquitismo e à anemia, com o que foi fazendo o carreiro das formigas de uma vasta clientela.
farto de ouvir falar em linguagem científica a outros que curavam menos que ele, Novo tratou de aprender uns versos e uns latins para recitar aos clientes enquanto os columpiava. dizia ele que um soneto bem botado aumenta a confiança dos enfermos. depois que aprendeu de cor uns versos e ladainhas, o mencinheiro já ajudava as mulheres prenhas a livrar-se em noites de lua cheia. e até conseguiu que uma freira paralítica saísse do columpio polo pezinho dela.
temendo que lhe decorassem a reza e co isso lhe roubassem o poder, Novo passou a dizer os versos ao revés. palavras de ocultis.
mas quando Novo morreu, o poder do columpio finou-se tamém. já nem os ratos lhe tenhem respeito.
vadio (Pt., Gz. e Br.)
cruzou por mim, veio ter comigo, numa rua da Baixa
aquele homem mal vestido, pedinte por profissão que se lhe vê na cara,
que simpatiza comigo e eu simpatizo com ele;
e reciprocamente, num gesto largo, transbordante, dei-lhe tudo quanto tinha
(excepto, naturalmente, o que estava na algibeira onde trago mais dinheiro:
não sou parvo nem romancista russo aplicado,
e romantismo, sim, mas devagar...).
sinto uma simpatia por essa gente toda,
sobretudo quando não merece simpatia.
sim, eu sou também vadio e pedinte,
e sou-o também por minha culpa.
ser vadio e pedinte não é ser vadio e pedinte:
é estar ao lado da escala social,
é não ser adaptável às normas da vida,
às normas reais ou sentimentais da vida.
não ser juiz do Supremo, empregado certo, prostituta,
não ser pobre a valer, operário explorado,
não ser doente de uma doença incurável,
não ser sedento de justiça, ou capitão de cavalaria,
não ser, enfim, aquelas pessoas sociais dos novelistas
que se fartam de letras porque têm razão para chorar lágrimas,
e se revoltam contra a vida social porque têm razão para isso supor.
não: tudo menos ter razão!
tudo menos importar-se com a humanidade!
tudo menos ceder ao humanitarismo!
de que serve uma sensação se há uma razão exterior a ela?
sim, ser vadio e pedinte, como eu sou,
não é ser vadio e pedinte, o que é corrente:
é ser isolado na alma, e isso é que é ser vadio,
é ter que pedir aos dias que passem, e nos deixem, e isso é que é ser pedinte.
tudo o mais é estúpido como um Dostoiewski ou um Gorki.
tudo o mais é ter fome ou não ter que vestir.
e, mesmo que isso aconteça, isso acontece a tanta gente
que nem vale a pena ter pena da gente a quem isso acontece.
sou vadio e pedinte a valer, isto é, no sentido translato,
e estou-me rebolando numa grande caridade por mim.
coitado do Álvaro de Campos!
tão isolado na vida! tão deprimido nas sensações!
coitado dele, enfiado na poltrona da sua melancolia!
coitado dele, que com lágrimas (autênticas) nos olhos,
deu hoje, num gesto largo, liberal e moscovita,
tudo quanto tinha, na algibeira em que tinha olhos tristes por profissão
coitado do Álvaro de Campos, com quem ninguém se importa!
coitado dele que tem tanta pena de si mesmo!
e, sim, coitado dele!
mais coitado dele que de muitos que são vadios e vadiam,
que são pedintes e pedem,
porque a alma humana é um abismo.
eu é que sei. coitado dele!
que bom poder-me revoltar num comício dentro da minha alma!
mas até nem parvo sou!
nem tenho a defesa de poder ter opiniões sociais.
não tenho, mesmo, defesa nenhuma: sou lúcido.
não me queiram converter a convicção: sou lúcido!
já disse: sou lúcido.
nada de estéticas com coração: sou lúcido.
merda! sou lúcido.
(Poesia de Álvaro de Campos, Fernando Pessoa)
domingo, setembro 21, 2008
palitroque (Gz.)
(fontes: Dicionário Estraviz; Diccionario Gallego-Castelán, de L. Carré Alvarellos; Diccionario Anacomas).
mojena (Gz.)
graf. altern.: "moxena"
averno
a Morte, vestida em branco, eis minha próxima amante.
minha sede pelo que é vermelho, crescente como a lua, como a palidez
e o branco, o infinito tom cadavérico de tua pele.
incógnito e inatingível é o meu ritual!!!
o obscuro somente me encanta, a noite é minha única companheira,
minhas três noivas: os astros, a solidão e a melancolia.
não me tenhas como Narciso, pois minha imagem é a de Pan...
feiúra exalta-me !!! a beleza? está em mim !!!
eu uivo para ti porque sou teu cão que chora e pranta pela dor de quem, aos
poucos, definha... sou vampiro que procura por líquido menstrual
e que jorra o sacro-semen por ti, oh meretriz dos céus!
afaste-se de mim ou venha a mim, para comigo dividir toda esta misteriosa,
densa e negra floresta interior - para nos perdemos entre os abismos...
o mundo é um mar de rosas ou de trovões ?!? os ventos sopraram
e fizeram tu escapar em pleno e puro Nirvana.
(Canção em Lua Negra de Averno, da banda Malkuth - Br.)
....................
imagem: http://www.lagoaverno.it/
sábado, setembro 20, 2008
e agora a Queimada
mas, nos seus elementos fundamentais, tem reminiscências célticas, co seu lume, o pote, a escuridão, o álcool e os conjuros e esconjuros, cousa que, vindo do fundo dos tempos, remexe no íntimo da i-alma e da cultura do Noroeste, fazendo o êxito da Queimada.
espécie de teatro folclórico, a Queimada tem lugar à noite, depois da ceia, em plena escuridão, onde ressaltam a colher de augardente botando chispas de lume e as lengalengas de conjuros e esconjuros que, pola sua toada irracional, resultam numa linguagem que atinge diretamente o coração dos presentes.
a última vez que me recordo de participar numa Queimada foi em Vilar de Perdizes, Montalegre, no rematar dos trabalhos de um Congresso de Medicina Popular.
não tendo sequer cinquenta anos, os conjuros da Queimada são muitos, destacando-se os seguintes (em grafia reintegrada):
CONJURO DA QUEIMADA (Mariano Marcos de Abalo, 1967)
mouchos, corujas, sapos e bruxas, demos, trasgos e dianhos,
corvos, píntigas e meigas, feitiço das mencinheiras.
podres canhotas furadas, fogar dos vermes e alimanhas,
ouveio do cam, pregom da morte, focinho do sátiro e pé de coelho,
averno de satám e belzebu, lume dos cadáveres ardentes,
mugido da mar embravecida, barriga inútil da mulher solteira,
com este fole levantarei as chamas deste lume que assemelha ó do inferno,
ouvi, ouvi! os rugidos que dam
e quando esta beberagem baixe polas nossas gorjas
forças do ar, terra, mar e lume, a vós fago esta chamada!
se é verdade que tendes mais poder que a humana gente,
CONJURO (Xosé María Pérez Paralhé, 1909-1987)
lume, luminha que verde caminha, da fraga à lareira fai-se lumeira
lume da quentura pra nossa fartura
lume abençoada que roda a queimada
pingota de orvalho, auga do agoiro
cerqueira de lume sem trasno nem fumo
nem bruxa chuchona, nem meiga ventona
rolar moinheiro, chiscar faisqueiro
mojena lumiosa, vagalume roxa
viradeira de luz, faremos a cruz
polo ar da sorte, que escorrenta a morte
pola auga da vida que sara a ferida
pola erva moura que o que abusca atesoura
pola pedra do raio que mata o meigalho
lume, lume, lume
lume lumeada para alouminhar
a queima queimada
da vida virada do borburelhar
polo Sam Silvestre, cam e palitroque
polo San Andrés ou polo Santiago
num reviravés queimada che fago
e queimada é
por curiosidade, querendo tentar:
QUEIMADA PARA 6:
- uma noite escura, vendo-se a lua
- 6 amigos e amigas
- uma panela de barro
- uma colher de pau comprida
- 6 malguinhas de barro
- uma fogueira ou lume
- litro e meio de aguardente de 45º
- meio quilo de açúcar
- raspas de um limão; pedacinhos de maçã ou bagos de uva, a gosto
- um quarto de litro de café do bom
companha
"santa companha" (Gz.): procissão noturna das almas
esconjuro
conjuro
sexta-feira, setembro 19, 2008
alimanha (Gz.), alimaria (Pt. e Gz.)
mencinheiro (Gz.)
ouveio (Gz.), uivo (Pt., Gz. e Br.)
verbos derivados: "oular" (Gz.), "oulear" (Gz.), "ouvear", "ouviar" (Pt., Gz. e Br.)
adjetivos: "ululante", "uivante".
latim (onomatop.): ululu, ululare
quinta-feira, setembro 18, 2008
meigalho (Gz.)
assim, é um meigalho qualquer maleita física ou psíquica provocada por vizinhos ou familiares malquerentes ou assim supostos, por inimigos, ou por diabos e outros espíritos malignos, que se metem dentro das pessoas para lhes perturbar a existência e a paz de espírito. são também meigalhos a histeria, a fraqueza inexplicável e uma série de padecimentos vagos do foro psiquiátrico.
dos meigalhos bons não se queixam as pessoas. que as vejo caminhando pola vida à cata deles.
o mago
e eu ia bebendo na fonte o que a bica botava.
vendo-me interessado e curioso, o home mandou-me uma estocada e quase me joga no tapete:
- sabes de onde vem o meu poder?
fiquei sem resposta, ante tantas hipóteses que me passavam pola mente. pelo que, após um interlúdio bem estudado, o home respondeu à própria pergunta rapando do boné que trazia na cabeça e pondo-me a testa dele na frente dos meus olhos:
- daqui!
e mostra um par de corninhos, um de cada lado da testa, quase simétricos, que trazia recatados no seu boné.
a Bíblia passou-se-me de repente pelos olhos de dentro: tamém a Moisés o pintam com uns cornos assim!
aí, passei ao contra-ataque:
- home, cando eu entrei ali pola porta vi cousas de deus ao lado direito e cousas do diabo na montra da esquerda...
- ...e sabes porquê? - perguntou triunfante.
- ora, respondi eu, a porta da tua casa é como entrar dentro da gente. deus e o diabo fazem parte da nossa natureza por igual!
a reação do home foi de incredulidade. olhou pra mim de cima abaixo e perguntou:
- tu que fazes? és vidente? filósofo?
- gosto de entender as pessoas, só isso.
quem ia comigo já não aturava mais a conversa e deu coa língua nos dentes:
- ele é psiquiatra!
fiz um esgar de zangado, mas o mal estava feito.
a conversa mudou de figura. o impressionante feiticeiro entrou em confissão. contou como tudo começara, ainda jovem. cousas difíceis de entender se tinham passado co ele. chegavam-lhe de outros mundos vozes e influências. andara polos médicos, sem que lhe dessem solução às dúvidas, incertezas, enigmas e temores. começou a frequentar congressos de medicina, de literatura e de cultura e arte, procurando respostas. tornou-se amigo de figuras de renome e influência.
a fama dos seus contactos com experiências além do real fez que o procurassem cada vez mais e de mais longe. a resposta encontrou-a ajudando os outros.
hoje é ele mesmo um ícone da cultura nacional galega e um museu na sua terra.
escarafunchar (Pt., Gz. e Br.)
terça-feira, setembro 16, 2008
não paga a pena
"não paga a pena plantar. a formiga come tudo" - Jeca Tatuzinho, de Monteiro Lobato
"às vezes ouço passar o vento; e só de ouvir o vento passar, vale a pena ter nascido".
(Fernando Pessoa)
outear (Gz.)
da mesma raiz latina que deu altus (alto) e altarium (altar, outeiro).
segunda-feira, setembro 15, 2008
madrasta (Pt., Gz. e Br.)
como adjetivo, "madrasta" significa "dura", "difícil", "ingrata". exº: "a vida tem-lhe sido madrasta".
fig.: mãe pouco afetuosa.
sábado, setembro 13, 2008
bruxa (Pt., Gz. e Br.)
a esse destino as condenou a Inquisição, trazida para a Península Ibérica por Fernando II de Aragão. o objetivo foi o de erradicar o sentimento e o pensamento pagão tradicionais, reduzindo tudo e todos a um só pensar e a um só sentir. no mesmo fogo arderam judeus e outras dissidências mais cultas e letradas, que deixaram relato de seu. mas as bruxas, que não sabiam ler nem escrever, não puderam deixar o relato heróico de suas provações e calvários.
às "bruxas" pintam-nas velhas e muito feias, magras, de queixo arrebitado e nariz adunco, montando uma vassoura voadora. não há pior metáfora do que passou a ser velho e caduco: a ordem tradicional, o matriarcado, as crenças populares, a medicina artesanal, a psicologia intuitiva, o transe terapêutico. os poderes de certas mulheres foram atribuídos a um pacto pessoal com o diabo, pelo que o seu destino só podia ser o fogo, à vista de todos. e a passagem de "bruxa" a adjetivo, com o significado de "velha feia, horrorosa e malfazeja".
mas, apesar do holocausto, a cultura popular sobreviveu até bem perto dos nossos dias. moribunda, já não inspira medo nem cuidado. já é possível organizar congressos, encontros e jornadas de feitiçaria, cultura e medicina populares, muito frequentados pela fina-flor da nossa cultura urbana.
é que, como diz o outro, yo no creo en brujas, pero que las hay, hay.
nota: sobre o tópico ver "meiga".
oxalá (Pt., Gz. e Br.)
exprime desejo de que algo pretendido aconteça. ver "quem dera!"
salamaleque
é a saudação de cortesia entre os turcos.
sexta-feira, setembro 12, 2008
fazer-se de novas
o significado sobrepõe-se, pelo menos em parte, à expressão "tirar nabos da púcara".
sumidoiro
na Galiza usa-se "sumidoiro" como sinónimo preferencial de "esgoto". exº: "a rede municipal de sumidoiros". mas tamém nos restantes sentidos da palavra.
quinta-feira, setembro 11, 2008
falangueiro (Gz.)
fazer orelhas moucas
do ponto de vista semântico, sobrepõe-se, pelo menos em parte, à expressão "fazer ouvidos de mercador".
tamém se diz: "a palavras loucas orelhas moucas", para significar que há coisas a que não se pode dar importância. o mesmo é dizer: "palabras tolas, orelhas xordas" (Gz.).
muito atual é o refrão "a falangueiros ditos, tapa os ouvidos" (Gz.), pois adverte para não nos deixarmos influenciar pelas falinhas mansas e boas falas.
sumir (Pt., Gz. e Br.)
derivados: "sumiço" (subst.) - desaparecimento; "levar sumiço" - desaparecer; "dar sumiço" - fazer desaparecer.
com esta postagem iguala-se o número de entradas de Toponímia Galego-Portuguesa e Brasileira, primeira das loucuras por onde me fiz viajante. a ideia comum é a de um serviço à comunidade da língua, pôr em contacto três povos com os mesmos adns, tantas vezes fáceis de dividir por sotaques, ortografias e microrregionalismos, mas, acima de tudo e apenas, pela falta de encontros e de reuniões periódicas e assíduas, onde se relembre, festeje, aprofunde e desfrute o património comum.
a internet, com a sua interatividade, é o lugar perfeito para o re-encontro.
quarta-feira, setembro 10, 2008
trinchar
prato
tamém se chama prato à variedade culinária que vai ser servida ou que pode ser escolhida de um cardápio ou menu.
e, ainda, há quem chame "prato" às antenas parabólicas.
garfo
colher, culher (Gz.)
a colher está presente em expressões como:
"entre marido e mulher não metas a colher" - significa que é errado, contraproducente e até perigoso tentar gerir racionalmente aquilo que, por natureza, é irracional e ambivalente.
"da colher à boca se perde a sopa" - significa que não se pode contar co ovo no cu da galinha, que uma coisa é prever e outra acontecer.
tigela
graf. altern. (Gz.): "tixela"
"de meia tigela": sem valor, medíocre.
tijola (Gz.)
na Galiza tamém se usa "tigela" com o mesmo significado.
graf. altern.: "tixola"
terça-feira, setembro 09, 2008
levar o carro à frente dos bois
entrar por um ouvido e sair por outro
ver Comentº de Calidonia.
fazer ver
segunda-feira, setembro 08, 2008
agochar (Pt. e Gz.)
sábado, setembro 06, 2008
mulherio
mulherengo
personagens célebres, reais ou literárias, como Dom João, Casanova, Rudolfo Valentino, Carlos Gardel não tinham o perfil de predadores, embora se fizessem acompanhar de dúzias ou centos de mulheres.
é que, em boa verdade, o predador não acompanha nem se faz acompanhar das suas presas: caça-as. e as presas, por sua vez, fazem questão de ser caçadas personalizadamente, uma a uma e uma de cada vez. como se fosse primeira e última. única. isto é, como se, não sendo, fosse.
graf. altern. (Gz.): "mullerengo", "mullereiro".
tamém se diz do home casado que anda com outras mulheres
sexta-feira, setembro 05, 2008
capoeira
no Brasil, "capoeira" é tamém uma forma incomparável de dança acrobática e arte marcial desenvolvida pelos escravos negros. de notar que os escravos que chegavam no Brasil eram chamados de "galinhas", tendo esta designação deixado marcas na toponímia (Rio de Galinhas). no séc. XVII, as invasões holandesas desorganizaram a sociedade do litoral, dando azo a que muitos escravos fugissem para o interior. a eles se deu o nome de "negros capoeiras" ou "capoeiras". terá sido um desordeiro, um tal tenente João Moreira, o criador desta forma de luta, a qual passou aos capoeiras, que a aperfeiçoaram e desenvolveram.
barbeiro
tamém: "o [vento] frio que entra pela barba".
cieiro ou sieiro
a terminação -eiro indicia um adjetivo substantivado pelo uso: de "gelo", "geleiro", "geeiro", "gieiro"ou "xieiro".
está semanticamente relacionado com a expressão "está um frio de rachar".
quinta-feira, setembro 04, 2008
sair a
exº: "sai ao pai", "sai à mãe".
até se diz que "quem sai aos seus não degenera". e verdade será.
esta expressão não anda longe de outra: "de tal gente tal semente" (Pt. e Gz.).
senlheiro (Gz.)
pressupõe uma etimologia em singularium (lat.).
ver Comentº de "o" * à postagem "quem dera!"
graf. altern: senlleiro
terça-feira, setembro 02, 2008
levar e trazer
significa "cuscuvilhar", "bisbilhotar", "espiar".
há por aí muitos serviços de levar-e-trazer, mas este acaba por ser o mais divertido.
pode causar alguns estragos, mas é completamente grátis.
dar à língua
certo é que "dar à língua" faz espairecer e é uma atividade eminentemente saudável. e que, como dizia o povo:
"as mulheres cando se juntam
a falar da vida alheia
começam na lua nova
e acabam na lua cheia"
hoje as mulheres já não "dão à língua" como antigamente. estão mais parecidas cos homes. talvez por isso, enchem os consultórios de psicólogos, psiquiatras, psicanalistas e afins, "dando à língua" sentadas na cadeira ou deitadas no divã, pagando pra isso.
segunda-feira, setembro 01, 2008
quem dera!
significa "oxalá!", "assim fosse...", "tomara!", "antes fosse...", "Deus quisesse..."
está por "quem me dera", ou seja, "haja alguém que me dê o que eu preciso".
retranca (1)
"estar na retranca": estar à defesa, mostrar reserva ou prudência.
ver "retranca" (2) - postagem de 17 de julho de 2009.
falar pelos cotovelos
quem fala pelos cotovelos nem sempre fala acertadamente.
a origem da expressão talvez resida no costume da gente que fala muito gostar também de dar cotoveladas à medida que vai falando, como forma de reforçar o discurso, chamar a atenção, tornar impossível que não oiçam o que diz.
dor de cotovelo
...quem dera!